A Coveira

Quando o sexto bebê apodreceu dentro dela, desistiu. Era isso o que seu útero era, uma tumba. Gerava para matar. Era como se dentro dela se engendrasse um plano macabro. Seu óvulo capturava o espermatozóide saltitante do homem, todo veloz e todo potente, saído de um pinto duro. E pronto, estava feito.

Ela o observava olhando aquele pinto no espelho. De frente, de lado. Medindo a mais, duvidando do tamanho, se convencendo, a convencendo, horas e horas de vida gastas dia após dia na utopia de ter o maior pau do mundo. E então a penetrava com aquele pinto que continha todas as grandes esperanças dele. Sem saber que nos confins da mulher que amava, enquanto ela o olhava com olhos de bambi, o mal espreitava.

Seu óvulo acolhia o campeão deles todos, daqueles microscópicos homenzinhos atletas e, quando ele ainda estava no alto do pódio recebendo a medalha de ouro da fecundação, a vida dentro dela iniciava seu plano de morte. Como um pequeno girino humano numa banheira de carne, seu filho começava a existir. Ossos, pulmões, rins, fígado, coração.

Riam quando ela dizia que sentia o pequeno coração dentro dela. Cento e vinte a cento e sessenta batidas por minuto. De repente ela ficava ali, imóvel, o gesto paralisado no ar, tomada por aquela realidade irreal. Dentro dela batia um coração que não era o seu. Às vezes se encantava. Em outras, era só assustador.

Ele abria a porta da casa com aquele olhar inseguro de quem deveria ter todas as certezas, mas também tinha medo. E no sofá da sala faziam planos para um filho que, de um modo diferente para cada um, os assustava mais do que poderiam confessar. Era um mistério, ela sabia, a razão de desejar tanto algo tão aterrorizante. Mas desejavam, ela e ele, cada um do seu jeito secreto. E queriam muito amar aquele coração voraz dentro de apenas um deles.

Nestes momentos, quando olhava para seu homem se esforçando tanto, pensava que para ele deveria ser quase impossível olhar para uma mulher que o tinha dentro dela. Se era difícil ter dentro, como seria ter fora? Não entendia por que ele não saía correndo, como tantos. E a cada noite surpreendia-se com a volta dele pela porta da frente.

E então, numa manhã, o sangue na calcinha. E a dor. Ela fechava as pernas como se pudesse impedir que o assassinato fosse consumado. E na sexta vez fechou tanto e escondeu tanto por tantos dias que apodreceu. Ficou semanas no hospital sem saber se ia viver. Nem mesmo sabia se queria. Mas ele, aquele homem assustado, mas sempre presente, estava lá. E um dia ela levantou da cama e voltou para casa. E os dois entraram, cambaleando, pela porta da frente.

No início, pensava que seu útero era tão sombrio, tão árido, que seus bebês se suicidavam. Achou que eles podiam ouvir seus pensamentos confusos, aqueles que não conseguia impedir. Sentiam seu medo, não só da vida, mas seu medo deles. Escutavam seus temores e preferiam morrer a tê-la como mãe. Ela era tão inadequada que seus bebês preferiam suicidar-se.

Depois entendeu que estava se enganando, tentando encobrir seu crime. Era ela que os matava. Que cortava o fluxo do rio que os alimentava até que morressem de fome antes de existir. Que os deixava sem ar até a morte por asfixia. Era o mal que ela não conseguia controlar que assassinava seus bebês. Um após outro, seis. Era ela, sempre havia sido.

Não pôde mais olhar para ele, desde então. Sentia vergonha e uma culpa que escapava pelos seus poros. Quis confessar, mas temia tanto que ele a abandonasse que se acovardou na primeira sílaba. Depressão, o médico diagnosticou quando ele a carregou para o consultório, puxada pela mão como uma autômata. Ela era uma serial killer dos filhos dele, e ele ainda queria salvá-la.

Então engravidou pela sétima vez. E desta vez não traçaram planos. E desta vez nem sequer reparou no rosto assustado dele, nem se comoveu com todas as tentativas dele de disfarçar seu medo. Nem ligou para sofrimento dele com aquela mulher triste e muda que era ela. E a barriga cresceu como se nem mesmo fosse dela, como se fosse apenas uma parte acoplada nela. Que não lhe dizia respeito. Ela estava além da culpa, naquele lugar vazio uma curva à frente da dor.

Quando seu filho nasceu, algo brilhou nos olhos dela. Algo fugaz. Seu filho sobrevivera a ela, à maldade dentro dela. Afinal, ela era falível. Olhou temerosa para o rostinho amassado do seu bebê e para o rosto além da felicidade do seu homem, o pai dele. Quase sorriu enquanto assistia àquela pequena criatura sugando o leite de dentro dela, aspirando no branco do alimento a escuridão invisível do mal dela.

Entendeu o quadro todo pela primeira vez. Era essa a sina inescapável dela, a de todas as mães. Dar a vida para um ser que vai morrer. Inexoravelmente.

Ela não suportaria. Queria ser boa, não má. Amava aquele filho, contra todos os prognósticos de sua depressão pré e pós-parto, contra toda a lógica, contra mesmo o seu desejo.

Quando a cabeça do marido pendeu no sofá do quarto do hospital, exausto e finalmente feliz, ela beijou a cabecinha redonda do filho, aconchegou-o no peito e o manteve ali até certificar-se da batida de apenas um coração.